domingo, março 25, 2007

portugueses e europeus

1957 deve ter sido um ano giro. primeiro nasceu a r.t.p., depois o gaston lagaffe, depois a futura união europeia, com a assinatura do tratado de roma, faz hoje 50 anos, quando portugal era um país cinzento e sem liberdade, onde o medo andava à solta pelas ruas e onde pensar livremente podia ser fatal. portugal acabou por se juntar ao clube europeu quase 30 anos depois, um portugal renovado politicamente, mas com profundas marcas deixadas pelos anos de ditadura. marcas profundas em termos de organização, em termos de modelos de exercício do poder. a identidade nacional ainda comporta as lesões e cicatrizes deixadas por esses anos de poder absoluto e arbitrário, em que a noção de pátria não era vivida com orgulho, mas por obrigação. não é certamente por acaso que apenas muito recentemente nos reconciliámos, via futebol, com o nosso hino e a nossa bandeira. é normal os povos gostarem do seu hino e da sua bandeira.

somos hoje cidadãos europeus. a mim dá-me alguma segurança saber que não estamos apenas à mercê dos políticos cá do burgo, que numa série de matérias estamos dependentes dos ideais e das directrizes que vêm de bruxelas. o núcleo duro da união europeia é mais civilizado do que portugal. digo isto sem qualquer sombra de dúvida. são povos que valorizam a vida colectiva, com hábitos de serviço comunitário, com vontade de produzir, com orgulho nas realizações do seu povo. não passam a vida com invejas e mesquinhices, a tentar denegrir a imagem dos seus pares, ou a tentar abafar pela maledicência qualquer um que se atreva a ser bom e a aplicar-se naquilo que faz. não passam a vida a servir-se despudoradamente do bem colectivo em vez de servirem o bem colectivo. têm hábitos de rigor e de eficácia. conversam aberta e frontalmente para resolverem os problemas comuns em vez de fingirem que querem resolver os problemas comuns, quando nem sequer se sente interiormente o significado da palavra comum, e apenas se quer resolver problemas particulares.

não se pense que sou daqueles que olham com os olhinhos a brilhar para tudo o que vem de fora. nada disso. tenho orgulho em ser português, tenho orgulho em fazer parte desta história, deste povo. gostava que por uma vez fossemos capazes de dizer "prá frente portugal!" com a mesma alegria que os espanhois dizem "arriba espanha!", gostava que portugal fosse um projecto colectivo, que encarássemos os problemas sociais como problemas nossos, colectivos, que a educação dos nossos jovens, a reabilitação dos nossos deficientes, a fome dos nossos pobres, a qualidade de vida da nossa 3ª idade, fossem encarados como tarefas colectivas e não apenas como responsabilidades das famílias envolvidas directamente. que as cidades fossem construídas e planificadas com vista ao bem estar comum e não à mercê de obscuros interesses imobiliários dessa raça maldita da contrução civil, pessoas a maior parte das vezes sem qualquer formação e transbordando de deformação. que encarássemos as ruas e as praças do nosso bairro como nossas também e que o espaço pelo qual somos responsáveis não acabasse na porta das nossas casas, nos portões dos nossos jardins.

temos ainda tanto para aprender como povo europeu. temos tanto para convergir. as classes dirigentes têm que compreender que dirigir é coordenar, é aproveitar o melhor que cada um dos elementos da equipa tem para dar ao objectivo comum. que chefiar não é encerrar-se num gabinete, rodeado de dois ou três lambe-botas. que a antiguidade não pode ser um posto. que as ideias dos colaboradores não devem ser encaradas como uma ameaça ao exercício da chefia.

convergir, sim, mas não na hora. somos um povo, temos que produzir para o bem estar comum, não somos meros objectos ao serviço da economia. é absurdo que alguns empresários nos queiram voltar a impor a hora central europeia, experiência já tentada e falhada em 1996. não brinquemos com as pessoas e os ritmos biológicos. não obriguemos toda a gente a levantar-se ainda de noite durante o inverno, ou a ter luz do dia depois das 22 horas no verão, só porque isso facilita as transações económicas. a economia tem que estar ao serviço das pessoas, não são as pessoas que têm que estar ao serviço da economia.

1 comentário:

Anónimo disse...

Bom, bom, foi Mario Soares não ter sido convidado pelo PR para as commemorações dos 50 anos do tratado de Roma, lol