quinta-feira, junho 19, 2008

sai uma dose de prozac para aquele país lá ao fundo da europa

adeus euro, adeus scolari. amanhã o país vai acordar e lembrar-se da crise, dos preços dos combustíveis e dos alimentos, de toda a realidade que é deixada para trás de cada vez que a selecção tem êxito. vai ser um país de ressaca, tristonho e acabrunhado, sem fé no futuro nem nos políticos. sem força para dar a volta por cima. o ano escolar a acabar, este tempo de verão que convida à preguiça, a silly season a começar (sim, eu sei que neste país nunca acaba). como será possível pôr este país a produzir? modernizá-lo, trazê-lo para o vigésimo primeiro século da era cristã, actualizá-lo? esta semana o meu filho mais velho fez exame de português para acesso ao ensino superior. a prova de exame serve de exemplo do que uma certa intelectualidade atávica representa. camões, memorial do convento e padre antónio vieira. passado, passado, passado. as glórias dos descobrimentos, as glórias dos descobrimentos. já sei que me vão dizer que camóes é importantíssimo, que o memorial do convento é uma obra esplêndida e que vieira foi um humanista de se lhe tirar o chapéu. mas eu vejo as coisas de outra maneira. enquanto a cultura portuguesa de maior relevo não for a actual, enquanto o orgulho pátrio não for no país que temos agora, no povo que somos agora, bem podemos protestar contra a crise, dizer que a culpa é sempre dos outros, que nunca sairemos dela. bem podemos ficar à espera do cadáver pútrido do d. sebastião que um dia chegará numa manhã poluída. sair dos gabinetes e vir para o terreno, acabar com o sucesso fácil e momentâneo, com as vaidades e ostentações sociais, com o cada vez maior fosso entre os que muito têm e os que não têm quase nada, olharmos uns para os outros, olhos nos olhos, e sentirmo-nos parte de um povo , de uma sociedade, de uma comunidade, essa é a difícil tarefa que temos pela frente. arregaçar as mangas e trabalhar, organizar, produzir mais com menos esforço. marcar mais golos com menos tempo de posse de bola e com menos floreados. jogadas certeiras e organizadas. é assim que se ganham os jogos.

10 comentários:

Luís F. disse...

Não podias ter feito melhor analogia… Para que serve jogar bem quando não se marcam golos? Aplica-se tão bem à nossa realidade… Já agora, correu bem o exame?

marta r disse...

És bem capaz de ter razão na maior parte das coisas que dizes.
Mas, para mim, o futuro também se constrói com referências do passado, com a memória das coisas. Não necessariamente com o fantasma do D.Sebastião...

nelio disse...

luís: teria corrido melhor se tivesse saído o pessoa. camões e as suas estâncias do canto nono sobre a glória da imortalidade não é propriamente apelativo...

reb disse...

Nélio, apesar de concordar com a análise sobre o fim da glória do futebol e as nossas ressacas, diz-me uma coisa: o que querias que o teu filho estudasse em lingua portuguesa 12º ano que não fosse literatura portuguesa? :)
só estudam autores do passado? mas se dizes que tb saiu o "memorial do convento". Essa é uma obra actual :)

Agora sem falar de literatura, sabes uma coisa: sem história não há memória e sem passado não há possibilidade de futuro...
Concordo que nos falta ânimo para seguir em frente, mas não penso que a causa esteja em nos orgulharmos do nosso passado...

reb disse...

os nossos comentários entraram ao mesmo tempo :)
percebi melhor o que dizias. Pelos vistos, este ano foi ano de camões. No exame de 9º ano tb saiu.
Os lusíadas é muito chato para os miúdos, mas o pessoa tb é dificil de analisar para muitos deles...

nelio disse...

marta: claro que o passado é importante para entender o presente e projectar o futuro. eu adoro história nessa perspectiva. não compreendo é que se fique fixado numa época longínqua que nada tem a ver com o presente. a sociedade, a produção artística, os valores, as motivações pessoais e sociais nada têm a ver com a actualidade.

nelio disse...

reb: o memorial é uma obra actual e que pode ter muitas leituras, mas refere-se também às glórias do passado. claro que os mi+udos têm que estudar literatura portuguesa. mas não há bons autores actuais? camóes é superchato. desafio qualquer membro do governo e a maior parte dos licenciados deste país a resolverem a prova de exame. chumbo na certa.

nelio disse...

é que estamos a falar de uma prova de acesso que pretende testar a compreensão do português e que serve para o acesso a uma série de cursos. se fosse uma prova de acesso a cursos de línguas, ainda entenderia, embora a minha opinião é de que os mangas de alpaca que fazem as provas há muitos anos que são ratos de gabinete e estão totalmente divorciados da realidade. masturbações intelectuais.

reb disse...

nélio, eu não vi a prova mas vou tentar apanhá-la. De facto, há uma coisa que não está certa: até há 2 ou 3 anos, havia o português A ( para quem seguia humanidades) e o B ( para os das outras áreas) Penso que isto já não acontece, mas tenho que me informar junto de colegas do secundário.
Nesse caso, acho um disparate pôr alunos a dissertarem sobre obras para as quais não têm todos a mesma motivação.
Quanto à elite "intelectual" que produz os exames mas está a léguas do que são miudos destas idades, concordo absolutamente contigo.
A prova do 9º ano tinha tb um texto do saramago sobre o sorriso. E numa das produções escritas, pedia-se aos miudos que desenvolvessem o tema do sorriso, considerando-o nesta perspectiva: "sorrir é o verbo mais transitivo que existe".
O que é isto??? O que pretendem que putos de 15 anos escrevam a respeito desta "metáfora"? Julgam-nos capazes de analisar linguagem poética como se fossem estudantes de letras??

Mónica disse...

palmas